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Como a La Niña 2021/22 poderá impactar a precipitação da América do Sul?

  • Foto do escritor: laisgfernandes
    laisgfernandes
  • 29 de out. de 2021
  • 5 min de leitura

Atualizado: 1 de nov. de 2021

Entenda mais sobre a evolução do próximo evento La Niña (2021/22) bem como quais são os impactos esperados na precipitação da América do Sul

As condições oceânicas e atmosféricas sobre o Pacífico tropical indicam que uma nova La Niña (LN) começa a se materializar pelo segundo ano consecutivo. Os previsores climáticos da National Oceanic and Atmospheric Administration (NOAA), Climate Prediction Center (CPC), aumentaram para 87% a chance da LN continuar a evoluir durante a primavera de 2021 e atingir o seu pico no próximo verão (2021/22). Ambas as estações, além do outono, podem apresentar impactos significativos nas anomalias de precipitação e nos eventos extremos de chuva na América do Sul (AS) quando a fase negativa do fenômeno ENOS (LN) está ativa.


A anomalia mensal média da Temperatura da Superfície do Mar (TSM) na região Niño 3.4 para o trimestre de julho, agosto e setembro já se encontra em -0,5°C, sendo esta a primeira condição necessária para classificação de uma LN. É possível ver na animação abaixo (Fig. 1) que as anomalias negativas de TSM no Pacífico equatorial já alcançam -1,0°C durante o mês de outubro.

Figura 1: Anomalias de TSM no Oceano Pacífico tropical entre 5 de setembro e 23 de outubro de 2021. Imagem de http://iridl.ldeo.columbia.edu/.


Um forte indicativo de que a LN persistirá até o próximo verão são as anomalias de temperatura da água em subsuperfície sob a região Niño 3.4 (Fig. 2). Estas anomalias em subsuperfície são a fonte de água mais fria para a superfície, e elas têm se intensificado nas últimas semanas. Outro importante sinal sobre o desenvolvimento da LN são as mudanças na Circulação de Walker sobre o Pacífico equatorial notadas pelos previsores climáticos da NOAA desde setembro. Os ventos alísios estão mais intensos que o normal, assim como as anomalias positivas (negativas) de precipitação na região da Indonésia (Pacífico central), o que indica um fortalecimento da Circulação Walker, o qual é esperado em anos de LN.

Figura 2: Anomalias de temperatura da água em subsuperfície nos primeiros 300 metros de profundidade monitoradas pelo CPC. Imagem de https://www.climate.gov/news-features/blogs/enso/october-2021-enso-update-la-ni%C3%B1a-here.


Apesar de eventos LN não serem mais recorrentes que eventos El Niño (EN), a fase negativa do ENOS (LN) acontece frequentemente em verões consecutivos enquanto que isso raramente ocorre para a fase positiva (ou EN). Sabemos também que a Oscilação Interdecadal do Pacífico (OIP) está atualmente na sua fase negativa. Como esta oscilação apresenta escala de tempo mais longa que o ENOS, e ambos os modos de variabilidade climática ocorrem no Oceano Pacífico, a OIP é conhecida por modular a frequencia e a intensidade dos episódios de ENOS. Por exemplo, se olharmos a tabela do índíce ONI para classificação dos estados do ENOS podemos ver claramente que eventos LN foram mais intensos (anomalias de TSM <= -1 °C) e recorrentes do ano 2000 para cá, período em que a OIP está negativa. Por outro lado, entre 1979 e 1999 eventos EN foram mais intensos (anomalias de TSM >= 1 °C) e frequentes pois a OIP estava em sua fase positiva. As previsões do CPC indicam que há 57% de chance da LN 2021/22 atingir anomalias de TSM <= -1 °C entre os meses de novembro e janeiro na região Niño 3.4.


Portanto, a intensidade das anomalias negativas de TSM no Pacífico equatorial e ainda a sua distribuição espacial, se mais na região central ou leste, será de extrema importância para o monitoramento dos impactos da LN 2021/22 sobre a precipitação e os seus eventos extremos na AS. A região centro-leste e sudeste do continente têm experimentado um prolongado período com precipitação abaixo da média ao longo desta última década, o qual se agravou nos dois últimos anos, gerando uma crise hídrica, e consequentemente, energética no Brasil.


Eventos canônicos (ou tradicionais) de LN, com anomalias negativas mais intensas de TSM na região do Pacífico equatorial leste são conhecidos por aumentar a TSM no Atlântico Sul tropical deslocando a Zona de Convergência Intertropical (ZCIT) para o sul, aumentando a precipitação (Fig. 3) e a frequencia de eventos extremos no nordeste da AS equatorial, via Circulação de Walker. Eventos LN leste também reduzem a precipitação no sudeste da AS (Fig. 3), aumentando a subsidência sobre esta região via Circulação de Hadley.

Figura 3: Anomalias diárias de precipitação em anos de LN durante o verão do Hemisfério Sul.


Na estação do outono (MAM) acontecem as maiores diferenças entre eventos LN do tipo leste e central. Em eventos LN central as anomalias positivas de precipitação abrangem não apenas a região nordeste da AS equatorial, mas também a região norte. Por outro lado, ambos os tipos de LN (central e leste) aumentam a frequencia de eventos extremos na região nordeste.


Além de impactar as anomalias de precipitação sobre a AS na estação de verão (ou monçônica, DJF), eventos LN também fortalecem a alta subtropical do Atlântico Sul nesta mesma estação e no decorrer do outono (MAM), influenciando a TSM do Atlântico Sul subtropical. Eventos LN central, mais frequentes também desde 2000 para cá, desencadeiam a fase positiva do dipolo do Atlântico Sul, favorecendo TSM positiva (negativa) anômala adjacente à região sudeste (centr0-leste) da AS (Fig. 4). Pode haver uma maior frequencia de eventos extremos de precipitação em regiões costeiras do Sul do Brasil durante a primavera e o verão de eventos LN central apesar da esperada seca no interior do continente. Eles estão associados principalmente ao estabelecimento da Zona de Convergência do Atlântico Sul (ZCAS) ao sul de sua posição climatológica, com convecção realçada sobre oceano.

Figura 4: Composições de anomalias de TSM em MAM em anos de LN e fase positiva do dipolo do Atlântico Sul. (Imagem de Rodrigues et al. 2015).


É ainda na estação quente que a chamada Oscilação de Madden-Julian (OMJ) ganha força, podendo reduzir ou aumentar a precipitação na região da ZCAS no pico da estação de monção. A OMJ sozinha chega a contribuir com até 30% do total da climatologia da precipitação para este período na região, justificando o seu monitoramento. O último evento de OMJ (Fig. 5) entrou recentemente em sua fase inativa, contudo se intensificou durante a fase 5 na primeira quinzena do mês de outubro, o que pode ter favorecido a ocorrência de precipitação no Sul do Brasil. Quando a OMJ se propagar em direção à AS e encontrar o estado básico da atmosfera condicionado ao evento LN 2021/22, o qual pode atingir intensidade moderada a forte em breve, os impactos desta oscilação mais rápida (OMJ) sobre a precipitação da AS podem ser intensificados ou atenuados em algumas regiões do continente.

Figura 4: Monitoramento da OMJ realizado pelo Australian Bureau of Meteorology (BOM). Imagem de http://www.bom.gov.au/climate/mjo/.


Acompanhe aqui no blog a evolução da próxima LN (2021/22) e dos próximos eventos de OMJ.


Gostou do conteúdo desse blog? Vai replicar as informações delineadas aqui? Por favor, tenha ética profissional e não se esqueça de citar a fonte original das informações, assim como eu faço aqui! Muito obrigada =)


Referências:



England et al. (2014) "Recent intensification of wind-driven circulation in

the Pacific and the ongoing warming hiatus", Nature Climate Change. https://doi.org/10.1038/nclimate2106.


Fernandes and Rodrigues (2017) "Changes in the patterns of extreme rainfall events in southern Brazil", International Journal of Climatology. https://doi.org/10.1002/joc.5248.


Grimm (2004) "How do La Niña events disturb the summer monsoon system in Brazil?", Climate Dynamics. https://doi.org/10.1007/s00382-003-0368-7.


Grimm (2019) "Madden–Julian Oscillation impacts on South American summer monsoon season: precipitation anomalies, extreme events, teleconnections, and role in the MJO cycle", Climate Dynamics. https://doi.org/10.1007/s00382-019-04622-6.


Rodrigues et al. (2014) "Why did the 2011–2012 La Niña cause a severe

drought in the Brazilian Northeast?", Geophysical Research Letters. https://doi.org/10.1002/2013GL058703.


Rodrigues et al. (2015) "The Impact of ENSO on the South Atlantic Subtropical Dipole Mode", Journal of Climate. https://doi.org/10.1175/JCLI-D-14-00483.1.


Tedeschi et al. (2016) "Influence of Central and East ENSO on precipitation

and its extreme events in South America during austral autumn and winter", International Journal of Climatology. https://doi.org/10.1002/joc.4670.





 
 
 

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